Dia da luta camponesa

Em 1996, eu era um bichinho perdido de olhos enormes e que tinha três estado de espírito: ódio, choro e vazio. E uma das coisas que me pesavam o coração, pesa até hoje. A absoluta injustiça da sociedade ocidental, fundamentada no capitalismo. Toda vez que falam que “ah deve ter um adulto por trás” de uma menina como Greta, Mari Copeni ou Tokata Iron Eyes, ou a geral da nação dos movimentos de ocupação das escolas no Brasil, eu penso em como essas pessoas não conviveram com o tipo de molecada que eu convivi, e que eu fui. A natureza da adolescência é a natureza da luta.

E naquela época eu já acreditava que, independente de qualquer questão que o movimento tenha, a resposta a “tudo isso que está aí”, no Brasil, é o MST.

Acompanhei com horror o massacre de Eldorado do Carajás.

A marcha indo para Belém reivindicar as terras improdutivas (que acabariam sendo entregues aos acampados depois de muita luta). 21 mortos, mais de 100 feridos, muitos que levam sequelas no corpo pelo resto da vida. A violência policial que chegou com ordens para matar. As execuções. Os corpos vilipendiados. É difícil explicar por onde começa o choque com a história, com um dos maiores crimes da história recente do país. Mas provavelmente para mim o que mais pesou na época foi que um dos assassinados era um rapaz de 17 anos, chamado Oziel.

E para a gente adolescente ativista, era como se fosse um de nós, porque era um dos nossos. Era um olhar entre nós e saber que poderia ter sido alguém igual a gente, igual a nossos amigos. E foi uma época pesada porque nós tinhamos perdidos alguns dos nossos, mesmo que não para esse tipo de violência, mas as feridas estavam abertas. É uma dessas pessoas que inspirou e inspira, e merece ter sempre sua memória honrada.

Eu sempre digo que viver é um ato político. Hoje, espero chegarem aqui em casa as minhas encomendas do Armazém do Campo, que vende os produtos produzidos em assentamentos. Comida orgânica mais barata do que a comida orgânica de qualquer mercado, mas essa comida aqui tem gosto de liberdade.

Acho que todo mundo deveria estudar o massacre. Entender porque tanto no BR quanto no mundo chocou as pessoas. Como tornou 17 de abril o Dia de Luta Pela Terra.

Recomendo que sigam o Instagram do MST, e leiam o portal deles. Que conheçam o trabalho da Via Campesina.

São muitas histórias a serem contadas.

Hoje, neste ano, eles chamam para que a gente “fique em casa mas não em silêncio”. Por isso falo do assunto. Por isso lembro dos mortos.
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E se faço aqui, onde falo de vida criativa é porque se viver é um ato político, tudo que eu crio é marcado pelas coisas que conheço, que vivi, que aprendo e que enxergo do mundo.

A luta camponesa é uma das coisas mais fortes e mais bonitas. E é a pequena agricultura familiar que nos alimenta e sustenta de verdade, batendo de frente ao agronegócio.

Cada coisa que chega na nossa mesa é uma história a ser contada.

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